Oi pessoal!

Eu sei, ciência é simples, mas método científico é uma coisa mais complicada de se entender…

Lembram deste post aqui, em que falo sobre o que é evidência científica? Nele, eu explico o que é evidência e por que razão a gente usa este método pra dizer, pelas lentes da ciência, se uma determinada conclusão pode ser feita ou não.  Se precisar, dêem uma paradinha aqui e voltem lá pra dar uma lembrada naquelas informações… pode ajudar!

Mas enfim, vamos lá!

Tem muita gente falando em meta-análise. Que tal meta-análise prova isso ou aquilo. Afinal, o que é meta-análise? E eu posso mesmo colocar minha mão no fogo pelo que ela diz?

Meta-análise não é um tipo de estudo. Meta-análise é uma ferramenta estatística, que junta estudos diferentes sobre um mesmo tema e tenta chegar a uma conclusão única e dar peso à essa decisão. Então eu posso juntar 10, 50, 1000 estudos sobre o mesmo tema, espremer todo mundo e, com a meta-análise, conseguir alguma informação comum a todos eles.

Mas eu posso mesmo dizer que uma conclusão de meta-análise é inquestionável?

DE JEITO NENHUM.

Pense que você nunca provou um bolo de fubá e quer saber se ele é gostoso. Você pede a muitas outras pessoas uma receita de bolo de fubá. Cada um faz de um jeito e vai lhe contar a própria receita. Uns usam bons ingredientes, outros, de péssima qualidade; uns usam um tipo de forno, outros fazem na panela elétrica; uns colocam queijo no bolo, outros não. Mas o que você quer saber mesmo é se o bolo de fubá é gostoso!

Então, você recebe estas receitas diferentes e quer, então, saber se o bolo fica bom. Mas quando você for fazer o seu bolo, que pedaço de cada receita você vai usar de cada uma que lhe foi enviada? Como vai poder dizer se o bolo é bom mesmo se uma receita usou ovos caipiras e outra usou ovos podres? O máximo que você vai poder dizer é que o bolo tem cara de ficar gostoso, mas, pra ter certeza, vai ter que experimentar desenvolver sua própria receita e dar para várias pessoas provarem.

Voltando para a ciência, o que temos é isso: na meta-análise, analisamos estatisticamente a junção de vários estudos diferentes sobre um mesmo assunto. Isso significa que pegamos estudos feitos em lugares diferentes, com pessoas diferentes, em contextos diferentes, mas que falam sobre aquela questão que você quer saber. Então, quando juntamos isso tudo, temos um apanhado de informações sobre aquele assunto, mas de forma ainda cheia de falhas. A meta-análise, neste caso, ajuda a apontar um caminho para que estudos melhores (mais adequados) sejam feitos e resolvam estas dúvidas.

Mas por qual razão isso não é suficiente?

Para dizer se uma medicação funciona ou não, precisamos eliminar todo e qualquer fator que possa confundir essa conclusão. Exemplo: idade, se há alguma doença de base, se o peso é diferente, enfim, se há qualquer coisa que pode influenciar no resultado do remédio. E essa intereferência acontece, todos nós sabemos. Então o que seria o correto no mundo ideal? Seria conseguir fazer com que A MESMA PESSOA, AO MESMO TEMPO, tomasse e não tomasse a medicação. Daí compararíamos se funcionou ou não, sem essas influências. Isso é possível?  Obviamente, não. Não dá pra tomar e não tomar uma medicação ao mesmo tempo.

Então o que fazemos? Desenhamos estudos que tentem diminuir ao máximo a possibilidade dessas intereferências (que chamamos de fatores de confundimento). Como fazemos isso? Criamos grupos que sejam os mais parecidos que a gente conseguir para que um tome a medicação e outro que tome o que a gente placebo (outro comprimido que seja qualquer outra coisa que não o medicamento em questão): que tenham idade semelhante, cuja distribuição de gêneros seja parecida, que tenham a mesma proporção de doença de base e todo o resto que pudermos conseguir equivalência. A isso chamamos controle. Com isso conseguimos eliminar qualquer coisa que possa confundir os resultados? Não, até porque existem características que podemos nem saber que são importantes. Mas diminuímos muito essa chance com o uso desta e de outras estratégias: a randomização, que distribui os pacientes aleatoriamente, de forma que os grupos tenham a proporções semelhantes de fatores de confundimento; e o cegamento, que significa que o paciente e, melhor ainda, tanto paciente quanto pesquisadores, não saibam quem tomou ou não tomou a medicação. O conjunto destas estratégias compõesm os estudos randomizados, duplos-cegos e controlados por placebo.

Percebam que as meta-análises não conseguem providenciar esse contexto, porque os estudos que são utilizados no seu somatório já aconteceram, não usam as mesmas metodologias, não comparam populações semelhantes, não são controlados e não são cegos. Ainda que utilizem isso, no seu conjunto, não há unidade, não há homogeneidade. É como comparar laranjas e limões, só por serem frutas.  Neste caso, as evidências – as informações que o estudo acabam trazendo – são muito fracas, não sendo suficientes para nos guiar com certeza na nossa atuação médica.

E tem mais: se eu juntar estudos de bom padrão, minha conclusão, ainda assim, vai sofrer, mas terá menos problemas. Mas se juntarmos um monte de estudos falhos, por mais que o desejo do pesquisador seja enorme, a conclusão a que ele chegará será MUITO EQUIVOCADA. Então não basta entender se os estudos falam sobre a mesma coisa, se os critérios utilizados foram semelhantes, se as populações foram parecidas, se as metodologias têm similaridade… além de tudo, é preciso avaliar a QUALIDADE dos estudos.

Juntando estudos bons, eu tenho um caminho interessante a explorar mais. Juntando estudos ruins, eu não tenho nada a não ser uma conclusão fraca, ou pior, completamente errada.

Em resumo: A META-ANÁLISE NÃO CONSEGUE DEFINIR A EFICÁCIA DE UMA MEDICAÇÃO E NÃO DEVE SER USADA PARA ISSO. O desenho ideal é a metodologia RANDOMIZADA, DUPLO-CEGA, CONTROLADA por placebo.

Agora mais fácil? Me conta o que você achou.

Abraços,

Drª Luana